paludário mostrando os ambientes aquático e aéreo.

Tem pano pra manga este assunto aqui, então resolvi dividir em 2 partes: uma introdutória, mais panorâmica e conceitual, e outra mais técnica e prática, falando sobre montagem, equipamentos e espécies de plantas e peixes para a parte terrestre e aquática. Ia ficar gigas se fosse num só, daí preferi separar.

Essa palavra “paludário” que pode até soar estranho aos seus ouvidos é até bem conhecida no hobby do aquarismo hoje em dia. Não é bem um aquário, pois nele criamos dois ambientes (um aquático e outro terrestre) e por isso podemos conhecê-lo também por aquaterrário, sendo que algumas pessoas ainda gostam de chamar de “ecossistema”.

O nome esquisito deriva do latim “palus”, que significa pântano (e dessa vez eu coloquei no tradutor e deu certo rsrs). Talvez você já tenha escutado termos como palude, palustre, paludoso…pois é, tudo isso é derivado daí. E entender isso já nos traz de imediato a questão da umidade, do contato da terra com a água, dos charcos etc, que é justamente o que procuraremos para criar um ambiente desses.

“Caramba, entrei num espaço de aquarismo e me vem o cara falar de terrário”… mais aí é que está…claro que tem a ver com aquarismo… é aquarismo! Aquarismo “plus”, diria. É um passo adiante para quem gosta de recriar ambientes naturais – como já falamos em algumas oportunidades sobre os aquários biótopos – e acha que falta alguma coisa ali, já que um corpo d’água natural não fica rodeado por vácuo ou antimatéria, mas sim por um enorme contexto de plantas, animais, pedras, troncos, folhas mortas e por aí vai. Aqui está a oportunidade de se pensar e executar a margem do rio ou lago idealizado, dando continuidade ao que temos dentro d’água.

Por falar em margem, para o pessoal que já conhece e pratica esse hobby (ou estuda temáticas como hidrologia florestal), há inclusive o termo “ripário” que se refere à margem ou à zona ribeirinha (sinonímia de zona ripária) para quando o foco da pessoa se volta à parte aquática. A outra parte seria justamente o “terrário”, cujo foco seria a parte terrestre.

Todavia, contudo, entretanto, nesse mar de termos, mesmo entendendo que, tecnicamente, palustre difere de ripário, vamos usar o termo paludário para explicar tudo que quero (até porque é o termo mais usado no hobby) e os que se animarem a testar na prática usam o termo mais apropriado, ok? Vamos lá.

As fronteiras da água e da terra

Como adiantei, quando falamos de paludário estamos adentrando um universo que exige do hobbista o cuidado, tanto do ambiente aquático quanto do terrestre, ambos existentes numa mesma estrutura.

O planejamento do layout e do ornamento transcende a água, algo além do que estamos acostumados no aquarismo, e pensa na parede da margem, nas imediações da borda, nas rochas e troncos maiores e vai até o teto do recipiente. Assim, preferi falar separadamente das duas metades, digamos assim, para podermos visualizar com mais tranquilidade e, depois, juntar tudo para ver o resultado.

Parte aquática

Aqui aplicamos tudo que já sabemos do aquarismo, considerando as ressalvas necessárias aos tipos de organismos que frequentarão a água. Sim, “organismos” e não somente peixes, pois temos paludários extremamente elaborados, com moluscos, crustáceos e mesmo anfíbios.

Aqui importará saber as melhores misturas de organismos. “Como assim?” Lembra quando falamos de misturas de peixes? Seria praticamente a mesma coisa. Digamos que você queira ter o camarãozinho asiático do gênero Neocaridina, aquele coloridinho, super lindo, comum nas lojas, sabe? Se você não está pretendo usá-lo como alimento para peixes, pense então nas espécies coabitantes, prefira peixes pequenos ou médio-pequenos, com baixa agressividade; especialmente na época da troca de carapaça, os camarões tornam-se extremamente vulneráveis a danos e à predação.

Outro detalhe. Como vemos nas imagens internet adentro, paludários (e sinonímias) são repletos de reentrâncias, o que pode afetar a efetividade de filtros, sendo que muitos optam por colocar caramujos, que comem algas e detritos. A ideia é ótima, mas alguns inconvenientes podem advir daí, tal como seria o exemplo de ampulárias – aqueles caramujos amarelões. Nem de perto estou dizendo que são ruins, mas quem já os teve sabe que às vezes eles saem do aquário e desovam na tampa ou na luminária; caso você não queira ficar limpando as desovas no cenário terrestre do seu aquaterrário, verifique junto às lojas melhores opções entre os moluscos. Lembro que existem planorbídeos (aqueles cujas conchas parecem chifre de carneiro) ornamentais, com um vermelho bonito, mas estes, por sua vez, carregam o estigma de serem hospedeiros de doenças transmissíveis aos humanos: esquistossomose (nem todas as espécies são vetores). Ou seja, antes de escolher é melhor se informar e evitar desapontamentos.

Em paludários, nem sempre temos muito volume d’água ou boa movimentação de água, assim especialmente nessa época de dengue pelo país afora, recomendo inserir espécies comedoras de larvas de mosquito, que podem ser poecilídeos (barrigudinhos, guppies, espadas etc.) ou mesmo betas (lembrando que fêmeas podem viver juntas e isso pode significar um colorido especial pro ambiente aquático, ao passo que aumentam o potencial predador de larvas).

É importante também sabermos controlar o pH e os compostos nitrogenados (em especial a amônia) dessa nossa piscininha envolta por rochas, troncos e terra. O filtro deverá ter a capacidade de cuidar dessa água, as sifonagens e também as trocas parciais precisarão ocorrer com o mesmo cuidado que temos num aquário. Um detalhe: em muitos paludários a água escorre em forma de “chuvas” e cascatas feitas por equipamentos, lavando tudo e carreando para dentro da água. O que quero chamar a atenção é pensar direitinho os caminhos dessa água, para reduzir a chance, por exemplo, dela passar numa parte de terra adubada e levar excesso de nutrientes para onde estão os peixes e comprometer a água.

Na parte 2 desta temática, quando formos abordar diretamente espécies a serem utilizadas, além de recomendar certas opções, citarei também escolhas que podem fazer desandar o projeto. Gruda aqui para ver como isso será!

Parte terrestre (aérea)

Confesso que os primeiros olhares num paludário são atraídos para essa parte emersa, especialmente dentre as pessoas que não manjam de aquário, tipo aquelas visitas que você recebe do trabalho, do curso ou da rua onde mora. Por isso, talvez, ela seja tão significativa, esteticamente falando.

Há uma gigantesca gama de opções que vemos os “paludaristas” executarem quando vão idealizar o ambiente aéreo (em contato com o ar atmosférico), ou seja, tudo que se encontra do lado de fora. Acrílico, cola de silicone e espuma expansiva para erigir a estrutura e troncos, rochas, terra, cascalho, fibra de coco e plantas das mais variadas espécies e cores para criar a ornamentação.

Sobre plantas, por exemplo, você já deve ter visto para venda aquelas plantinhas coloridas que vêm em recipientes fechados com tampa, certo? Garrafas, cilindros de vidro, cubos e mesmo potes de algum alimento (palmito, azeitona etc.), pequenos ecossistemas fechados. Quando viermos a ver as plantas que podemos aproveitar num paludário, usaremos muitos exemplos dessas plantas usadas nesses arranjos. Para fauna, dependendo da estrutura e da complexidade que o hobbista deseja criar, há quem opte por incluir no sistema pequenos artrópodes “de jardim”, salamandras e lagartos – por ser o ambiente muito úmido, a locomoção dele por cima e por dentro do substrato confere aeração e ajuda a evitar mofos, por exemplo.

Plantas altas no fundo, pequenas na frente; contrastes de vermelho, amarelo e verde das plantas com o cinza de rochas ou o marrom dos troncos; plantas que crescem na sombra numa parte, outras que precisam de luz mais próximas ao foco de iluminação; musgos, epífitas, samambaias e plantas que precisarão de um vasinho com terra nutritiva. Tudo isso é passível do nosso planejamento.

E são justamente essas adições, essas escolhas, que determinarão o nível de cuidado com o paludário. Todos os animais precisarão comer, então deveremos saber bem o que, quando e como prover essa alimentação. Anfíbios, em sua maioria, requerem umidade controlada, tal qual plantas como bromélias ou musgos; e por falar nas plantas, fertilização e iluminação precisam entrar na conta.

Umidade

Como já falado, por significar “pantanoso”, a umidade é um quesito importante. Boa parte dos aquários feitos para esse fim tende a possuir paredes laterais e traseiras mais altas (extensões do vidro que o constitui). Isso serve não só para ajudar a apoiar a estrutura aérea, mas também ajuda a manter certa umidade.

Sozinha, porém, a estrutura de vidro (o aquário) não seria capaz de segurar a umidade, por mais que proteja o sistema de correntes de vento, sendo que alguns artifícios são comumente utilizados para esse fim. Daí partem duas definições fáceis de entender, onde temos sistema fechado e sistema aberto.

Aberto, por sua vez, é fácil de entender, pois não há tampa nem nada protegendo a seção aérea. Por fechado, podemos subdividir em hermético ou só com tampa ou porta; para ser hermético, no entanto, é bom deixar claro que isso normalmente se dá em recipientes bem pequenos e é dedicado praticamente a terrários, não aquaterrários. Por outro lado, é comum encontrarmos paludários fechados por meio de portas ou tampas.

Quando se tenta manter a umidade no ambiente, o hobbista se vale tanto de equipamentos próprios para tal, como aspersores que promovem uma verdadeira chuva no sistema (aqui é bom ter portas no recipiente), quanto o nebulizador (Mist Maker). É muito comum e recomendável fazer cascatas, que façam a água passar por ondem estejam as plantas que requeiram mais umidade; cascatas também ajudam a oxigenar a água, ou seja, também favorecerá os peixes e seres submersos nesse sistema.

imagem de um paludário com sistema aberto.

Imagem de um paludário com sistema aberto.

imagem de um paludário com sistema fechado.

Imagem de um paludário com sistema fechado.

Primeiras precauções e dicas

  • É tentador (eu sei) querer busca tudo que você precisa na natureza, mas cabe o aviso que sempre damos no aquarismo: itens vindos diretos da natureza podem vir “sujos”, o que me faz dizer que é recomendável ir atrás das lojas especializadas. Mesmo quando eu disse que alguns escolhem colocar artrópodes de jardim, normalmente eles escolhem quais são os que povoarão seu terrário; por vezes o próprio substrato é comprado. Pense bem antes de simplesmente coletar.
  • O uso de vasos, potes ou tigelas deve observar a ausência de arestas ásperas ou cortantes. Para que servem? Os fins são inúmeros: plantar algum vegetal, servir de piscina para seres da parte aérea, local de dessedentação de animais etc.
  • Baldes e instrumentos, tal como recomendado para aquário, devem ser de uso exclusivo, sem terem sido usados para limpeza ou com produtos químicos não apropriados aquarismo.
  • Água tratada: sem cloramina e metais pesados, o uso de condicionadores é altamente recomendado.
  • Se você já tem um aquário, mas pensa em mudá-lo para algo inusitado, considere fazer um paludário, experimente usá-lo como base. Serve bem e há muitos projetos de adaptação na internet, que podem partir da colagem (cola de silicone para aquário) de “prateleiras” de vidro nas laterais e na traseira, para apoiar a estrutura aérea.

E é por aí gentem, esta é a conceituação geral que precede a parte mais técnica de montagem. Esperem, pois no próximo texto tratarei mais da parte executiva, dando sugestões e técnicas para se montar um paludário.

Espero que o texto tenha trazido algo de novo ou útil. Agradeço a leitura e vejo vocês no próximo artigo!

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