Eis que depois de ter lido o meu texto que ambienta essa história de paludário, você pensa alto: “Show, quero montar um e aí, o que faço?” Estou aqui para lhe ajudar. E se não leu, clica aqui e dá uma olhadinha.

Há inúmeras opções do que pode ser falado e, principalmente, usado nesta parte prática, assim, vou iniciar como se já tivéssemos um projeto e estivéssemos executando ele, passo a passo.

O recipiente

Não dá nem pra começar sem um lugar para colocar as coisas dentro, né? E como seria esse lugar? Praticamente qualquer aquário antigo (ou novo) daria, embora eu vá recomendar algo mais apropriado. Existe no mercado um “estilo” – digamos assim – de aquário para se montar um paludário (ou mais tecnicamente: aquaterrário). Independentemente da forma (se ele está na vertical ou na horizontal), a estrutura é de vidro e vem com um corte baixo no vidro da frente, que é a peça que irá delimitar o máximo da altura da coluna d’água no sistema, o resto da estrutura se resume em 3 paredes, que é onde apoiaremos o nosso layout aéreo (fora d’água).

Ainda cabe dizer que algumas pessoas se utilizam de um aquário baixo e fazem a parte aérea sem nenhum auxílio de paredes, valendo-se apenas de rochas e troncos grandes que ficam, parte mergulhados, parte expostos – no entanto, veremos que as peculiaridades que abordaremos aqui (uso de vegetação terrestre, cachoeiras e névoa) ficam mais bem alocadas numa ideia como a que trabalharemos a seguir.

Como dica de formato de aquaterrário, por pessoalmente achar mais fácil e seguro para manusear e promover a manutenção, eu indicaria o aquário que tenha suas paredes laterais cortadas em ângulo. Também aconselho que as paredes laterais tenham alguma pintura externa (normalmente preto) que possa ocultar a parte “grosseira” da estrutura que construiremos.

Observação que faço: é especialmente indicado o ambiente fechado para se manter a umidade quando o ambiente for mais exigente; em alguns arranjos (considerando certas espécies de plantas ou animais) são requeridos percentuais mais altos de umidade (70 -80%) e isso só em sistema fechado. Aquaterrários com portas também são importantes para quando ele comporta organismos com maior mobilidade ou capacidade de fuga. Só que não falaremos tão profundamente nele, então…sigamos…

Equipamento

Falamos, desde o primeiro artigo de paludário, em umidade, cachoeira, névoa e qualidade da água (para a parte aquática), ou seja, precisamos de apoio mecânico e tecnológico para essas benesses. Como equipamento essencial precisamos de: 1) filtro (cânister é muito usado, mas podemos baratear isso com uso de algum tipo de filtro interno) para manter a qualidade da água, 2) termostato + aquecedor para dar condições de temperatura aos peixes, 3) bomba submersa, para jogar água pra cima e criar uma cascata (oxigena a água, irriga a parte aérea e coopera com a umidade do sistema), 4) iluminação, adquirida conforme o projeto (exigência das plantas escolhidas). “Puxa, pouquíssima coisa, como é fácil ter um paludário!

Claro que isso de “equipamento essencial” é relativizado quando o aquarista se propõe a tornar tudo mais desafiador e mais detalhado. “Como assim?” Suponhamos que você decida caprichar também no ambiente subaquático, com plantas mais exigentes. Necessariamente você precisará prover, no mínimo, substrato fértil, iluminação e CO2 para permitir que as plantas se desenvolvam bem. Você aplicará aqui todo seu conhecimento de aquário plantado, tal qual manda a regra, ou seja, o “essencial” dependerá do que você escolheu.

Sobre a umidade também há que se pensar. Além da cascata, que levará água às plantas do lado de fora, muitos são os hobbistas que se valem da construção de um “sistema de chuva”, que pode se dar por canos instalados na superfície da estrutura e que atuam por constante gotejamento, quanto por instalação de aspersores, cuja bomba que move o sistema é acionada periodicamente por um timer – normalmente esses sistemas são ocultados por tampa.

Um equipamento que embora não seja essencial, mas que sinceramente não acho dispensável é o nebulizador (mist maker ou fogger). O aparelho é colocado submerso, próximo alguma saída planejada, onde fabrica uma névoa densa que traz um tom de pântano ou misticismo, sei lá… se bem feito é extremamente charmoso o efeito. Existem exemplos em que o aquarista se utiliza de uma caixa acrílica com bicos ali colocados e por onde se desprende a névoa, que desce como uma cascata. As possibilidades de uso são infinitas.

Só aproveitando que eu falo de vez em quando de sistemas fechados, há também no mercado um sensor/medidor de umidade, que serve para ajudar a controlar os níveis de umidade, um equipamento que pode ser essencial a depender do que escolhemos para manter em nosso aquaterrário. Luz ultravioleta pode ser requerida caso você escolha manter na parte terrestre alguma espécie de réptil compatível com o ambiente, mas que exija esse tipo de luz.

Layout: Material de Estrutura

Anota aí pra uma espécie de checklist: tela colmeia (acrílico), espuma expansiva, cola de silicone para aquário, supercola (cola instantânea), tela “tipo” mosquiteiro (só que não fina demais), rochas, troncos, cascalho, areia, palha de coco…vamos aqui meio que construir a estrutura inicial de nosso paludário.

Ao pensarmos na forma que colocaremos as coisas no aquaterrário (desenhar num papel, ajuda muito), pegamos a tela colmeia e a armamos como um esqueleto (cortando, amarrando e colocando na posição que queremos). É ela que irá delinear as partes elevadas do arranjo do layout, assim como ela deve reservar atrás/abaixo espaços por onde passarão fios, mangueiras, canos e onde será alocada a bomba submersa, o aquecedor, o filtro e o que mais deverá conter e que deverá ficar escondido.

Feito isso, usaremos a espuma expansiva para preencher toda superfície da estrutura – estamos mesmo criando um painel. Depois da espuma estar seca, usamos uma faca ou estilete para moldar a superfície, criando buracos e sulcos por onde correrá a água, deixando espaços para colocarmos vasos de planta e abaulamentos para preenchermos com terra. É um trabalho misto de engenharia criativa e arte pura – observação: não é regra, mas alguns aquaristas evitam aplicar a espuma direto nos vidros, eles usam placas, isopores etc. de anteparo para o caso de quererem mudar tudo um dia e não terem de lidar com vestígios grudados no vidro.

Para fugir da cor branca da espuma, existem vários subterfúgios: cobrir com palha de coco, forrar de musgos, usar tinta atóxica e (entre outros) meu preferido: usar cola de silicone + pó de rocha/areia. Neste último aqui, espalha-se a cola na superfície já trabalhada da espuma e aplica-se o pó da rocha ou alguma areia de cor parecida ou que combine com o layout. Espera secar e teremos uma verdadeira muralha de cor natural. A vantagem de ter as paredes laterais pitadas está justamente aqui, pois cuidamos bem do visual dessa parte dianteira e os bastidores (maquinário, estrutura, cabos etc.) ficam escondidos.

Importante lembrar que nesse tipo de construção precisamos também pensar na transição do ambiente aéreo para o aquático, até porque através da água veremos tudinho. Assim, usamos pedra menores na base, que serão submersas quando enchermos de água. Para mantê-las ali, podemos colá-las tanto com supercola como com a cola de silicone. É importante que não seja hermeticamente vedado, pois a água da “vitrine” deve também poder circular pelo sistema de filtro, que teremos o cuidado de ocultar atrás da nossa muralha natural. Cuidado, aqui seria apenas para se evitar deixar frestas grandes que permitissem a passagem de peixes para o lado oculto de nosso paludário.

Dicas: 1) ao usar grandes pedras que entrem em contato com o vidro do fundo, lembre-se de calçar isso com um isopor (o contato/pressão diferencial contra o vidro pode trincar); 2) a bomba submersa, mesmo escondida, deve estar protegida por grade ou tela plástica para evitar que peixes passem e sejam sugados.

Layout: Decoração, flora e fauna

A dica para uma boa decoração é brincar com o contraste entre tipos de material, tamanhos, formas e cores dos objetos usados (rochas, troncos e plantas).

Como temos uma grande variedade de plantas como opção, dentro e fora d’água, ou em diversos setores da parte aérea, o importante é saber onde encaixar cada planta no local adequado, considerando tipo de superfície (vaso, solo, pedra, tronco), sombra, umidade e luz. E por falar nisso vamos ver algumas opções para usarmos num paludário, considerando as aquáticas, as aéreas e as da zona de transição:

Seção aérea: muitas das que se usa em terrários cabem aqui, tais como colocadas como plantas carnívoras, bromélias, orquídeas e samambaias, obviamente com cada qual sendo devidamente assistida. Bromélias, por exemplo, precisam ficar num lugar onde respingue água, assim se você não contar com sistema de aspersão de água, deixe-a próxima à cascata. Orquídeas epífitas sobre um tronco, sem tanta água assim. Captou como devemos pensar a respeito de cada escolha? Isso já deve ter sido previamente planejado naquela construção do painel, sabe por quê? Para já ter o nicho, que cada uma precisa, prontinho para recebê-la.

Vamos tomar outras plantas como exemplo para visualizar melhor. Uma que simplesmente sou fã é a Fitônia, encontrada até em mercados, é uma planta emersa que gosta de ter as raízes úmidas, iluminação indireta e ficar num solo fértil; características parecidas com o que prefere a mini samambaia. Outra opção excelente e fácil de encontrar para esse ambiente é o Musgo fofão, que também cresce sobre um solo bem fértil e com umidade abundante. Observe comigo aqui como é importante pensar que as correntes de água (cascata ou outra água corrente) não devem passar por cima desse solo fértil e carregar tudo para dentro d’água, onde estarão os peixes… senão haverá um sério problema de excesso de nutrientes ali.

Seção aquática: aqui lhe servirá qualquer planta de aquário que você conhece, mas eu daria uma dica importante, que pode ser limitante também: que ela caiba no volume disponível de água, a considerar que em paludários os volumes são consideravelmente menores. Aqui vão alguns exemplos: Cryptocoryne spp. e Ludwidgia palustris (nome sugestivo) – atentando, claro, para as exigências de luz, substrato fértil e CO2, e Salvínia (planta flutuante, pouco exigente, para ornamentar a lâmina d’água). Eu evitaria aquelas plantas de crescimento rápido como cabomba, elodea e valisneria.

Zona de transição: chamei assim para diferenciar uma região que necessitará de muita água passando ou sendo regularmente borrifada. Nessa região encontramos algumas conhecidas do aquarismo que se dão bem como emersas também como a Anúbia ou Musgo de java (que pode ser colado com supercola em paredes e canais), ambas as plantas necessitam de pouca luz; a já citada Ludwidgia palustris também pode ser encontrada emersa. Aproveitando, citaria também a Bolbitis, samambaia africana, que requer luz e nutrição otimizadas.

Vegetação artificial, pode?” Sim. Pergunta se eu gosto, vai… “Você gosta, Johnny?” Não. Eu tenho um grande prazer em ver as coisas se desenvolvendo e por isso eu nem recomendo (mas é uma opção válida, ok?).

Quanto a fauna a ser utilizada em paludários, as opções também são infindáveis, pois podem ser habitados por distintos grupos de animais como répteis (lagartos e cágados), anfíbios (pererecas, sapos, axolotes e salamandras), insetos, moluscos, crustáceos (camarões e caranguejos) e peixes. Sobre peixes, no entanto, temos aqui no blog uma porção de artigos, então, para saber sobre eles é melhor recorrer aos outros textos, já que, seja num aquário, seja num aquaterrário, todas as exigências e recomendações são idênticas. Para os demais, devemos apenas pensar em como nosso sistema pode atender às demandas das espécies escolhidas como umidade, temperatura, luz, fuga, esconderijos, predação etc.

Por exemplo, os famosos camarões Neocaridina, que podem colorir muito a região subaquática, ou o camarão fantasma, precisam ser sabiamente misturados com espécies que não ofereçam perigo a eles – especialmente na época de muda de carapaça, eles são muito vulneráveis à predação. Camarões, assim como caramujos planorbídeos e ampularídeos, são excelentes para controle de algas e restos alimentares. E pensando nessa função acessória de limpeza, há relatos de hobbistas que se utilizam de isópodes (caracol de jardim) para promover a circulação de ar dentro da terra, pois em ambientes em que o nível de humidade é elevado é comum a proliferação de mofo.

Como alerta eu frisaria que certos animais, mesmo sendo comuns em terrários, podem fazer desandar certos paludários. Cágados, como os tigres d’água, por serem conhecidos como sujões, podem gerar manutenção demasiada e desanimar o hobbista. Outra coisa, dentro e fora d’água, se você tiver criado um layout muito ornamentado, evite organismos escavadores ou se municie de técnicas para manter a decoração intacta, como cercar plantas enraizadas de pedras ou plantá-las em vasos, para evitar o desplante.

Manutenção

E como não poderíamos deixar de falar, para que o sistema esteja sempre funcionando, para que tenha aquela aparência viva e atraente, saudável, precisamos dedicar algum tempo para cuidar.

Além de limpar os vidros, realizar poda das plantas para enaltecer a estética e fazer testes de pH e compostos nitrogenados na água, é recomendável que a cada 15 dias você faça uma troca parcial de 50%, nos mesmos moldes que temos para os aquários (ou seja, uso de sifão para coletar a sujeira que o filtro não pegou e reabastecer a água já tratada: mesma temperatura e sem cloro). Como falamos de um ambiente de umidade constante e imaginando que poucos paludários têm sistema de aspersor de água, tenha um desses borrifadores manuais de água para você umedecer tudo.

…é, trata-se de um universo novo, que engolfamos aqui no aquarismo, cheio de horizontes e opções para colorir nossa vida. Espero que este texto lhe sirva como um precursor para pesquisar mais a fundo e colocar em prática aí na sua casa.

Agradeço demais a leitura e espero você no próximo artigo… até lá!

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