Já passou pela sua cabeça eleger o melhor dos melhores dentre os peixes? Como você avaliaria frases como: “O meu acará-bandeira é bem melhor que o tricogaster leri do Juquinha, está sempre com seu cardume embelezando meu aquário!” ou “Pacífico? Não há peixe mais de boa que meu kinguio!”, ou ainda “Beleza mesmo é ver um cardume de 30 neons nadando pelo aquário, contrastando com meus 20 rodóstomus!”.

Nem vou fingir que você vai cair novamente na historinha de que há como se eleger o melhor de alguma coisa no aquarismo, sem antes, obviamente, encontrar pelo caminho uma porção de “poréns”.

A ideia do texto de hoje se volta ao status de melhor peixe, no entanto, a pergunta que deve ser feita para começar cada conversa seria: “melhor pra que?” ou “melhor sob qual ponto de vista?”.

Pensei em cinco quesitos para abordar o tema e para cada ponto, os argumentos seguintes virão relativizar o tópico, mostrando que tudo se firma no correto planejamento somado ao seu olhar apeixonado sobre os habitantes do aquário.

A maioria dos comentários partiu ao ser considerado um aquário de 60x30x40cm (72 litros de volume bruto) como um tamanho médio, talvez uma média dos aquários comprados pelas pessoas que se aventuram no aquarismo.

Tamanho (máximo do peixe)

Esse quesito não tem mistério, tem a ver com o tamanho que o peixe atinge quando adulto. Fica fácil entender e aceitar, visto que não é tão subjetivo quanto os outros quatro quesitos que veremos a seguir, pois para saber basta medir.

O que há de ser considerado neste quesito se reflete no bem-estar do animal e em como o peixe poderá se valer do seu porte (ou sofrer por causa dele). Vamos lá…

Muitos conhecem o Balashark (Balantiocheilos melanopterus), peixe de cardume que gosta de águas turbulentas e de espaço para nadar. Sempre bem animado, compra-se o peixe nas lojas com tamanho de uns 5cm aproximadamente, mas ele cresce até uns 35cm… Ora, se ele chega a 35cm, precisa de espaço abundante e bombas submersas que gerem uma boa correnteza, você acha que viveria bem num aquário de 60cm? A resposta é não. Enquanto ele é pequeno não é problema, mas quando ele crescer, o que você fará? Não é permitida a soltura na natureza. Comprará um aquário grande o suficiente? Espero que sim, mas caso você não tenha espaço físico ou condições de fazer isso, é preferível que você conheça os peixes ANTES de os adquirir.

Manter um peixe grande demais para o recipiente que os mantém equivale a manter uma ave numa gaiola em que ela mal consegue abrir as asas…isso implica em maus tratos. Encontrei relatos que a vida do peixe pode ser reduzida a ¼ (um quarto) de sua potencialidade, onde um peixe que vive 20 anos acaba vivendo apenas 5.

Outro ponto a ser levado em consideração, quando o assunto é o tamanho, é o prejuízo das interações, quando desejamos o bem-estar geral. Jamais me esquecerei de quando eu era criança e tinha, no mesmo aquário de 30 litros, kinguios (Carassius auratus, meu preferido era chamado de Moby Dick) e Mollys (Poecilia sphenops). Por acaso falamos aqui de dois peixes “preferencialmente” vegetarianos, (o primeiro também come plâncton e invertebrados bentônicos e o segundo insetos e pequenos invertebrados aquáticos), pacíficos sem dúvida. Agora, o que pensaria uma criança pequena ao ver sua primeira cria de molinésia ser completamente aspirada por um afoito peixinho dourado? Foi o que aconteceu comigo, nunca esqueci. O tamanho de um alevino de Molly e de um Kinguio de “tamanho comercial” (uns 6cm) é tão diferente que o fato de caber na boca já é um ponto negativo quando se quer manter as duas espécies juntas. Por que eu frisei “tamanho comercial”? Porque o kinguio é uma espécie que pode ultrapassar 40 cm em sua longa vida, de duas ou três décadas…sua boca cresce com ele, e outros peixes pequenos demais podem facilmente ser aspirados.

Sem mesmo considerar o hábito alimentar, sabemos por experiência que muitos peixes são oportunistas, especialmente nos casos em que têm fome. Isso pode ser expandido para outros casos. É fácil imaginar um Oscar (Astronotus ocellatus) alimentar-se de um plati (Xiphophorus maculatus), pois o primeiro é piscívoro, mas é plausível e esperado que o Acará-Bandeira (Pterophyllum scalare) faça o mesmo com neons (Paracheirodon axelrodi) muito pequenos ou foguinhos (Hyphessobrycon amandae).

Exemplos assim no dão um primeiro aviso: a mistura de peixes de tamanhos muito distintos entre si seria uma interação não desejável num aquário comunitário, por isso, sempre considere o tamanho máximo do peixe adulto.

Pacífico (ou agressivo?)

Um peixe pacífico é um peixe que não mostra hostilidades contra outros convivas de seu recinto. Existem peixes agressivos e pacíficos, mas não é uma característica estática. Em certos momentos a agressividade pode surgir, ser exacerbada ou reduzida.

Podemos considerar certos detalhes que podem fazer a diferença neste quesito, como por exemplo, convívio com congêneres (peixes da mesma espécie ou gênero/táxon), presença de fêmeas ou espaço adequado para nadar (um peixe estressado pode se tornar mal-humorado).

Outra condição: o peixe pode até ser bem pacífico, em termos gerais, todavia, por ser naturalmente predador ele sobe algumas categorias no sentido “perigoso” (por favor, não entenda isso ao pé da letra), em relação à maioria dos demais peixes ornamentais. Quero apenas dizer com isso que se um peixe, posto num aquário comunitário, vier a ameaçar a vida de outro por ser um predador, este não é um bom colega (não estou falando sobre alimentação de peixes, apenas do convívio em aqua comunitário).

Existem outros casos que parecem angariar mais adeptos a uma opinião mais perto da unanimidade, quando falamos de “peixes agressivos”. Mergulhando num local de águas cristalinas e alcalinas, onde são comuns peixes agressivos – o lago Malawi  – destaco o Melanochromis chipokae (facilmente encaixável no tópico seguinte). Nem mesmo os amantes de CAs indicam aquários menores que 200 litros para ter uma fera dessas. Quando estabelece território, defende-o com tanto vigor que acaba estressando e machucando outros colegas. Ele não é “proibido”, mas a montagem de um aquário com ele deve observar mais cuidadosamente alguns detalhes: misturar com peixes de agressividade compatível, evitar congêneres, evitar padrões de cores similares, evitar fêmeas….e por aí vai.

Enquanto eu escrevo isso, é bem provável que criadores de Ciclídeos Jumbo Americanos, como o Jack Dempsey (Rocio octofasciatum) e Salvini (Trichromis salvini), estejam rindo, considerando a espécie citada como um “peso pena” num aquário desse naipe. Quando a agressividade entre os companheiros é equivalente, relativizamos esse quesito. Em poucas oportunidades tais peixes chegam às vias de fato, visto que na maioria das vezes são ensaios. Duelar com outro oponente pode causar injúrias sérias e eles sabem disso; ter as nadadeiras rasgadas, a mandíbula deslocada ou mordidas no corpo pode ser o caminho para a derrocada. Dessa forma, para haver luta deve haver algum motivo ou distúrbio muito forte.

A incompatibilidade de agressividade entre os peixes de um aquário é ruim, procure mesclar peixes equivalentes neste quesito.

Bagunceiro (ou bem-comportado?)

Podemos incluir aqui os peixes sem gosto por design de interiores. Peixes que revolvem o fundo, destroem ou desplantam as plantas do aquário, derrubam objetos, ou seja, tiram o seu sorriso a todo momento.

Provavelmente já veio a sua mente peixes como um ciclídeo cavador de substrato, tal como o Citrinelo (Amphilophus citrinellus) ou um pequeno Convict/Prisioneiro (Amatitlania nigrofasciata). De fato, peixes assim não são compatíveis com delicados e intricados layouts, porém, não somente ciclídeos estariam elencados aqui.

Dependendo de nossos propósitos para com o aquário (ex; com plantas), alguns peixes se tornam incompatíveis. Dojôs (Misgurnus anguillicaudatus), cascudos muito grandes ou com hábitos contrários ao desejado (ex: Panaque nigrolineatus) e mesmo o já citado Kinguio, podem desmantelar seus sonhos de plantas crescendo bonitas pelo aquário.

Imagine: você se preocupa com a escolha do substrato fértil, com a iluminação correta, seleciona e aloca as plantas de acordo com sua desenvoltura e coloração…aí vem dojô gordo e se enfia no cascalho, desfaz tudo que você demorou horas ou, quem sabe, dias para conseguir; ou ainda um cascudo “ranzinza” que desajeitadamente desenterra plantas e esburaca as folhas; sem falar na possibilidade do peixe ser um devorador inveterado de folhas tenras como as de uma Elodea spp., deixando-as só no talo…era o que meu Moby Dick fazia.

A bagunça pode também ser instaurada com peixes ativo demais. Relatos são feitos quando se misturam Discos (Symphysodon discus) com peixes que vão com muito ímpeto na hora da ração, onde os primeiros intimidam-se, escurecem e, consequentemente, adoecem. Guppies (Poecilia reticulata) e Mato-Grosso (Hyphessobrycon eques)? Também não dá, pois misturar o “grande cauda” com o “mordedor de cauda” não parece ser saudável.

Beleza (ou feiúra?)

Nada mais subjetivo. Gosto não se discute, tampouco a beleza vista pelos olhos de alguém. Se você acha bonito não adianta tentar mudar, é bonito e pronto! Mas…e quando o brilho ofusca e a beleza enfeitiça?

O ciclídeos do lago Malawi estão entre os peixes mais coloridos, ficando atrás apenas dos marinhos. Normalmente os ciclidófilos que mantêm esses peixes são criteriosos, não fazendo qualquer mistura.

A única coisa que dá pra falar neste quesito é: não se deixe levar por um “rostinho bonito”, sem se preocupar com o “conteúdo” – isso pode levar qualquer pessoa, especialmente iniciantes, a se decepcionar profundamente com o hobby…sem falar nos peixes que sofrerão.

Resistente (ou sensível?)

“Resistente” é uma palavra que gera em muitos iniciantes a impressão de “ah, esse peixe aguenta tudo!”. Entretanto, a ideia aqui não é retratar tal tipo de sentimento – uma vez que o aquarista quer dar o melhor ao peixe e não o fazer resistir às provas de CrossFit – mas sim destacar aqueles que possuem maior amplitude de tolerância a certos parâmetros de água ou mesmo um range ideal mais amplo.

Alguns peixes são conhecidos por sua elevada resistência (no sentido de tolerância – que significa suportar condições fora dos parâmetros adequados), os quais podemos citar: Tricogaster Azul (Trichopodus trichopterus), Paulistinha (Danio rerio), Kinguio (Carassius auratus) ou o Espada (Xiphophorus helleri). Não que eles mereçam viver em qualquer tipo de água, mas, no geral, eles suportam algumas variações em parâmetros como pH e até mesmo presença de amônia na água (o que é péssimo).

Às vezes, porém, o sucesso de um peixe, dito resistente por alguns, pode estar atrelado ao modo como o aquarista desenvolveu seu layout. Tomo como exemplos os magníficos Iriatherina (Iriatherina werneri) e a Jordanella (Jordanella floridae), que se desenvolvem muito melhor em aquários plantados; num caso como o da iriatherina, ter um aquecedor,  é essencial, visto que não gosta de águas frias e sim mais quentinhas (22 a 30ºC). Alguns aquaristas podem julgá-los frágeis, outros resistentes, pois uns usaram certas manhas e outros não.

Pode-se, assim, dizer que resistência também é relativo, todavia, ninguém precisa testar a resistência de um peixe para comprovar ou desdizer algum texto que outrem escreveu sobre condições ideais.

Só para dar vazão à brincadeira, acabei criando uma tabela com notas para elencar peixes dentro dos quesitos abordados.

Pacífico – Notas de 1 a 10, sendo 1 Mahatma Gandhi e 10 Chuck Norris
Tamanho – Notas de 1 a 10, sendo 1 Frodo Baggins e 10 Smaug, o Terrível
Bagunceiro – Notas de 1 a 10, sendo 1 Alfred, mordomo do Batman e 10 Dennis Pimentinha
Beleza – Notas de 1 a 10, sendo 1 a Bruxa do 71 e 10 a Liv Tyler (pode ser a Nicole Kidman)
Resistente – Notas de 1 a 10, sendo 1 Robin (personagem da DC, “queixo de vidro”) e 10 Scarlett Johansson (que nem atrapalha o cabelo nas batalhas dos Avengers)

O que você achou desse quadro? Concorda? Mudaria algo? Lembro que é absolutamente subjetivo, partindo do meu ponto de vista e experiência, algo que pode ser diferente para você. Na verdade, eu não sei dizer – e acho que ninguém saberia – qual o melhor peixe. Não há. Existem boas escolhas para cada tipo de aquário e “zé fini”.

Fatores que favorecem a “escolha do peixe ideal”

Pode ser que tudo que falta para o seu peixe ser ideal seja o modo como você montou (ou virá a montar) o aquário. Pode ser que, frente ao que dispomos de infraestrutura para receber peixes, faça com que o seu peixe ideal não seja, por exemplo, um cardume de balashark, mas sim um belo aquário estilo amazônico, com bandeiras, neons e rodóstomus nadando. Dessa forma, eu consideraria os seguintes itens para refletir sobre os ideais:

1.     Tamanho do aquário compatível com o tamanho máximo dos peixes;

2.     População em níveis adequados, tanto em termos de número como de compatibilidades entre as espécies (não misturar agressivos e pacíficos, muito grandes com muito pequenos etc.);

3.     Qualidade da água, ou seja, medir e controlar parâmetros regularmente, assim como investir num bom filtro;

4.     Estudar as características do peixe a ser adquirido, para saber se ele possui alguma exigência específica que dificulte sua manutenção;

5.     Até mesmo detalhes simples, aparentemente bobos, podem refletir no bem-estar do peixe, evitando que fique estressado, como posicionar o aquário num local onde não incida luz direta do sol, nem fique num corredor movimentado, com passagem constante de pessoas, ou mesmo cuidar para que na troca d’água observe-se a necessidade de eliminar o cloro.

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