Apistos. É assim que chamamos estes peixes na intimidade. O termo é uma abreviação da primeira parte de seu nome científico: APISTOGRAMMA. Trata-se de um gênero sul-americano, pertencente à família Cichlidae, dentro da categoria (informal) dos ciclídeos anões, pois não ultrapassam mais de 13 cm nos exemplares adultos.

Mas… será que apenas um gênero justifica um podcast inteiro? Vamos tirar nossas conclusões…

Quanto à DIVERSIDADE, contabilizam-se 89 espécies dentro do gênero… isso ao se falar em espécies com a identificação firmada taxonomicamente, ou seja, não considerando espécies em processo de identificação ou as variações. Será que é tudo “mais do mesmo”? Tipo um peixe com 89 diferentes pronúncias do nome? Quem tem ou já teve um apisto responderia um categórico “não”.
Cada Apistogramma é um planeta completo, num universo de maravilhas ciclídicas. Certamente alguns são mais parecidos com outros, todavia, alguns são completamente diferentes em termos de comportamento e de condições para se manter num aquário.
Estão distribuídos numa vasta região tropical sul-americana, sendo encontrados nos mais distintos tipos de ambiente, fator que, naturalmente, nos dão a ideia de que suas formas, cores, comportamentos e exigências são tão diversos quanto sua distribuição.
E como escolher um? Eu escolhi, não um, mas três, assim que bati os olhos: Apistogramma borelli, Apistogramma agassizii e Apistogramma macmasteri. Pronto! Falei na lata! E esses nem são os mais raros – com a exceção do macmasteri, que não é dos mais fáceis de achar. Já tive os dois primeiros (que são relativamente fáceis de obter) e o terceiro vi na casa de amigos. Isso basta para se apaixonar! Escolher é fácil, encontrá-los e mantê-los é outra história.
A primeira coisa que se convém observar é a água…

A água é um dos fatores-chave para o sucesso na manutenção de qualquer peixe e, no caso dos apistos, pode significar completo sucesso ou fracasso. Na vastidão de nosso continente, encontraremos espécies que vivem em rios que variam o pH de ácido pra alcalino, águas cristalinas ou escuras, sob influência de correntes ou com mínima movimentação. Porém, isso não quer dizer que todas as espécies do gênero Apistogramma se adaptam a qualquer tipo de água, pelo contrário, são bastante exigentes quanto ao tipo certo.
Cabe aqui uma peculiar explicação, no que se refere aos tipos de água dos rios amazônicos; são três principais, normalmente tratados com o nome em inglês: “black water” (água negra), “white water” (água branca) e “clear water” (água clara). Por que isso é tão relevante? Porque, ao tratar de apistos, fatalmente você se deparará com essa denominação em algum momento e a informação pode fazer toda diferença.
Black water é a água com aquele aspecto de chá mate. Caracteriza-se por possuir ácidos húmicos e fúlvicos e um composto chamado tanino, oriundos da decomposição vegetal; fatores que fazem o pH despencar para a acidez. Cursos d’água com esta denominação são, normalmente, pobres em nutrientes (minerais dissolvidos), com boa transparência e possuem fluxo lento. Todavia, não basta ser escuro para ser black water, mas sim ter as características mencionadas; digo isso porque muitas vezes rios escuros podem ter sido tingidos por influência dos sedimentos do leito. Nosso Rio Negro é o maior black water do mundo; são também classificados assim o Tefé, Arapiuns (afluente do Tapajós) e o Vaupés (afluente do Negro).
White water, por sua vez, indica água rica em nutrientes, com grandes concentrações de matéria dissolvida e em suspensão, tendendo a ser turva; tem o pH mais alto, próximo ao neutro. Os rios Purus, Juruá, Japurá e Madeira são exemplos dessa água. Mesmo chamando-se “branca”, ela apresenta a cor dos sedimentos ou materiais predominantes que estiverem em suspensão. Rios com tal água são responsáveis por até 80% do montante de pesca para consumo humano.
Por fim, clear water são águas que têm características mais próximas às negras, com exceção da cor, pois advêm de regiões de drenagem onde não têm muito o que carrear (zonas de baixa erosão).
Além do que descobrimos sobre os tipos de água, quem tem experiência em manter apistos reforça o quão importante é você manter a água livre de compostos nitrogenados e sem sais dissolvidos (entre parêntesis “baixa condutividade”) – repetindo pra não esquecer “livre de compostos nitrogenados e sem sais dissolvidos”, principalmente quando se tratar de indivíduos selvagens e, especialmente, no que se refere à água negra.
O conselho é certificar-se da origem de cada espécie de interesse para poder “customizar” a água do aquário. Agora, você pode olhar para uma água de aspecto feio, tipo marrom, e nem por isso achar que ela é ruim. Grave uma coisa com você: a cor da água, por si só, não representa sua qualidade.

Você já deve estar pensando “Enfim peixes que aceitam aquários pequenos!”. Será que você está errado? Não está não, mas o pensamento não é de todo verdade. Saiba que tanto aquários pequenos, como a maioria das espécies de Apistogramma, não são recomendados para quem não acumula alguma experiência. E, aproveitando que entramos no assunto, já adianto que um outro macete para se manter apistos é pensar no layout, seja ele mais funcional, ornamental ou natural.
Se o aquário for para reprodutores, não esqueça de fornecer a eles o tipo preferido de substrato para que eles depositem seus ovos, sempre adesivos. Há quem destine troncos, vasos de cerâmica, cacos de telhas de barro (sem arestas com corte, viu?), pedras maiores etc. Estude bem a espécie que planeja reproduzir e leia sobre o acondicionamento dos peixes com aqueles que obtiveram sucesso. Nesses aquários, decoração natural vem em segundo (ou terceiro) plano.
Se a ideia é tê-los em um aquário ornamental, aí sim, seria interessante você caprichar na caracterização – conforme o gosto da espécie, pois costumam ser tímidos, procurando sempre locais abrigados ou sombreados. Dicas: folhas largas, troncos e cavernas os deixam mais confortáveis. Acredito não ser exagero dizer que para todas as espécies citadas um substrato que contenha folhas mortas (tipo uma serapilheira), seja bem-vindo, pois, além do abrigo, propiciará ao ambiente uma qualidade “natural”, podendo ajudá-lo a controlar o pH em níveis baixos. São mais comumente usadas folhas de amendoeira e de cajueiro, que demoram mais a se decompor. Se a acidez da água lhe impedir de colocar plantas, use troncos e raízes; se houver um pH aceitável, lembre-se de fertilizar o solo para que cresçam saudáveis.
Em qualquer um dos casos, não é necessária a movimentação excessiva de água, assim, bombas submersas leves têm bom resultado; lembre-se que eles (em sua maioria) preferem águas ácidas, não sujas; para tanto, filtros são necessários. Outra coisa também é certa: apistos gostam de águas quentinhas e, para tal, tenha sempre um termostato e um aquecedor confiável como material essencial para este tipo de aquário. Quanto à alimentação, os apistos são onívoros, aceitando muitos tipos de alimentos vivos e também ração comercial – este é um investimento importante para mantê-los bem.

Agora, não se esqueça de que falamos de ciclídeos, os quais têm o comportamento territorial da família, podendo tornar-se ainda mais agressivos com seus congêneres e, especialmente, nas épocas de reprodução. Dar o espaço adequado, o layout adequado e fazer misturas de espécies com parcimônia são também segredos para o êxito. Em poucas linhas: não se colocam diversos casais de apistos em espaços pequenos, sejam eles de espécies distintas ou não, por várias das razões anteriormente mencionadas!
Acredito que a reprodução envolva os mais notórios momentos na vida de um apisto. Talvez seja uma das fases mais interessantes, por ser a época dos displays, onde as cores estão pra lá de acentuadas. E, por falar em cor, as fêmeas de apisto adquirem coloração amarelo ou laranja, bem vivo, o que é um excelente indicativo da aptidão dela para reproduzir.
São ovíparos e os ovos são adesivos, normalmente colocados sobre superfícies protegidas. No cuidado parental, a mãe se torna superprotetora, momento que requer do aquarista cuidado especial, pois há a chance de ela machucar o macho. Não é comum, nem fácil, mas pode acontecer. O inverso também é verdadeiro: os machos podem ficar especialmente agressivos na época de reprodução, ou seja, se a fêmea não estiver pronta para reproduzir ou rejeitá-lo por algum motivo, pode ser que ele se volte contra ela. Nesta informação, reside a importância de saber como se comportam os peixes: se deve ser harém ou casal, se o recinto deve ser densa ou pobremente plantado, se o espaço oferecido é suficiente… coisas assim.
Embora tenha feito os alertas, hoje em dia, porém, devido à dificuldade de se obter certas espécies e mesmo pela falta de espaço físico, muitos aquaristas fazem a reprodução deixando um casal por aquário; mas estes hobbistas mantêm-se atentos e, a qualquer sinal de que a coisa vai desandar, retiram um dos peixes.
Esta informação não valeria a pena se não houvesse um espaço para citar algumas das espécies de apistos… não é possível exaurir, mas pra criar curiosidade…

APISTOGRAMMA CACATUOIDES
Começamos pelo (indubitavelmente) mais famoso de todos. Sua denominação “cacatuoides” advém das “mechas” (raios dorsais) que saltam eriçados de sua nadadeira superior, dando o aspecto de uma cacatua. Foi reproduzido com tanta intensidade pelo sudeste Asiático que, além de virar o mais comum de todos os Apistos, muitos exemplares passaram a portar defeitos físicos, provenientes do esforço reprodutivo com baixa qualidade/responsabilidade. O frenesi de seleções, responsáveis por criar variações nas cores e tamanhos de nadadeiras, também ajudou com que muitos exemplares se tornassem inábeis para reprodução.
Por falar nisso, quando atingem a maturidade sexual, os machos têm um incremento de tamanho em sua cabeça. A enorme boca é usada para intimidar ou mesmo duelar com seus oponentes, durante os displays ritualísticos. Ovos são depositados em cavernas, onde a fêmea realiza a proteção dos ovos e filhotes.
Espécie onívora, com cerca de 8 cm, tem origem na bacia do rio Amazonas: rio Ucayali (Peru), no próprio Amazonas (até mais ou menos o município de Tabatinga-AM); onde as águas não são negras (black water) – pH entre 6.0 e 8.0, água mole (embora seu ambiente sofra variações) e temperatura entre 24 e 25 ºCelsius.

APISTOGRAMMA AGASSIZI
Agora um dos meu preferidos. Os machos têm a cauda em formato de lança, sempre colorida, e são maiores que as fêmeas, algo em torno de 7,5 cm. Na verdade, essa história de machos maiores, acho que serve para todos os Apistos.
Por estar também entre os “pops”, não foge de uma extensa gama de variedades existentes, obtidas a partir de seleções, como: “Red Tail”, “Double Red”, “Red-Black”, “Double Full Red”, “Super Red”, “Blue-Red”, “Red-Gold”… Por outro lado, a natureza faz sua parte, dando-nos variedades conforme a localidade onde é encontrado: “Rio Madeira”, “Novo Aripuanã”, “Santarém”, “Novo Airão” ou “Tefé” – também com muito mais tipos.
Com origem na bacia do Rio Amazonas, desde o Peru até o Brasil, vivem em águas de pH entre 5.0 e 7.0, água mole, e temperaturas quentinhas (26 º a 29 ºCelsius). Nesta extensão toda, podem ser achados nas águas negras ou claras.
Esta é uma das espécies que prefere haréns, o que reflete na exigência de um aquário maior. Um aquário de cerca de 70 litros (60x40x30 cm) pode comportar bem um pequeno grupo, sendo um macho e 3 ou 4 fêmeas.

APISTOGRAMMA BORELLII
Absolutamente tendencioso que sou, por achar este um dos mais lindos e pacíficos apistos, apresento nosso representante do Pantanal brasileiro! Ele é originário da bacia do rio Paraguai, entendendo sua distribuição até o baixo rio Paraná, na Argentina. Chama atenção o contraste do seu corpo prateado ou azulado com a dorsal alta e amarelada… tipo o topete do Johnny Bravo dos cartoons.
Menor que seu antecessor (5 cm no macho), também pode ser mantido num aquário de mesmo tamanho, onde a temperatura seria ligeiramente menor (24 º – 25 º Celsius) e o pH maior (6.0 a 8.0); é um dos mais resistentes e fáceis de encontrar.

APISTOGRAMMA BITENIATA
Esta é uma das espécies que exige a “black water”; temperatura na faixa dos 23 º a 25 º Celsius, água bem mole e pH ácido (5.0- 6.0). Possui duas faixas longitudinais (por isso é biteniata, sacou?), uma no dorso e uma no meio do corpo, alcançando cerca de 5 cm em aquário. Sua origem engloba a bacia do rio Amazonas, porção do Peru (rios Nanay, Mazán e Tigre), Letícia, na Colômbia; e igarapé Preto e lago Tefé, no Brasil.

APISTOGRAMMA TRIFASCIATA
Vizinho do borellii, por ser oriundo do rio Paraguai, também possui ocorrência na bacia amazônica. Destaca-se por ter os raios dianteiros da nadadeira dorsal bem destacados e por possuir três faixas longitudinais (mesma lógica do outro, trifasciata é três faixas). Água mole, temperatura (26 º a 29 º Celsius) e pH (6.0 a 6.5) maiores que o antecessor, assim como o tamanho, que pode alcançar 8 cm no macho.

Gente, é muita coisa…tem que pesquisar e correra atrás. Aqui neste podcast é só pra dar gostinho mesmo. Apistos carregam consigo o mal dos ciclídeos, que é cativar as pessoas com seus hábitos complexos e ainda trazem de brinde as cores. Quando você os tem no aquário dá pra entender porque tantos aquaristas fazem de tudo para criar o melhor ambiente possível.
Bem, espero que estas palavras tenham levado alguma informação útil… Até mais!

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