Para não acharem que, na prática, aquário biótopo seja referente apenas ao Bioma Amazônico, resolvi tentar trazer outro bioma de grande significância para nós brasileiros: o Pantanal, a maior planície alagável do mundo.

Para nivelar o contexto e para ajudar a visualizar, lembro que o pantanal fica numa depressão gigantesca do continente (tecnicamente uma bacia de sedimentação), formada quando houve o soerguimento da Cordilheira dos Andes (movimentos de compensação: sobe num lugar, desce no outro), sendo circundada em nosso país por planaltos escarpados. Ao longo dos tempos esses planaltos vêm sendo erodidos e o sedimento carreado para dentro da planície pantaneira (Pantanal propriamente dito).

No Brasil está situado nos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, ladeando a Bolívia e o Paraguai, na parte oeste. O rio Paraguai é o principal e dá nome à bacia, mas são muitos afluentes que contribuem com a água que inunda o Pantanal nas cheias, seja da parte dos planaltos, seja já dentro da bacia de sedimentação, dentre eles destaco os rios Paraná, Cuiabá, São Lourenço, Taquari e Miranda.

Por fim, é importante pontuar que congrega características dos biomas Amazônico, Cerrado e Mata Atlântica, quando falamos em área contínua, e essa condição de intercessão entre biomas faz com que o Pantanal acabe sendo funcionalmente um elo entre mundos aquáticos. Assim, dá para deduzirmos que sua fauna é abundante e, claro, que tal diversidade se expanda para dentro d’água, nos mundos submersos que nos interessam aqui nos podcasts.

Feições do bioma (layouts para aquário)

Para falar de idealização de layouts do Pantanal, tentei fugir de uma definição superficial que falasse apenas de cheia e seca e busquei algumas feições comuns de lá para ver se conseguia apresentar como sugestão para se pensar num aquário. Friso duas:

Corixos: vistos especialmente na época de estiagem, as águas vazam dos campos formando canais que ligam as águas de baías, lagoas e alagados até os rios mais próximos. Estes pequenos rios, normalmente perenes, podem ser caracterizados pelo que entendemos como leitos de rio, ou seja, areia como substrato, rochas, troncos e plantas aquáticas; sem mistério para quem já adentra o assunto dos biótopos, o lance seria escolher as espécies da região.

Camalotes: também conhecidos como aguapés, tais ambientes são constituídos pelo conjunto dessas plantas aquáticas flutuantes, que se formam em grande parte nas margens das baías e rios. Pode até ser que você não use os aguapés, por razões óbvias, mas pode tentar recriar o ambiente com plantas fluentes mais compatíveis com aquários.

Nesse ambiente caracterizado por alagamentos periódicos, me veio à mente um tipo de aquarismo que mistura a água e a terra: o paludário. Um paludário (ou aquaterrário, num sentido mais amplo) é uma mistura de área aquática e terrestre, normalmente plantada, onde se mesclam organismos dos dois ambientes. Assim, é possível até mesmo reunir seres além dos peixes e plantas, tais como crustáceos, anfíbios e determinados répteis.

Rapidamente, cito um caranguejo dulcícola, Dilocarcinus pagei, (tamanho 6,5 cm, temperatura: 20 a 28°C e pH: 6.8 a 7.5) e um camarão, Macrobrachium nattereri (tamanho de 6,5 cm, temperatura: 24 a 30°C e pH: 4.0 a 7.0), ambos da região. Alguns cuidados devem ser observados, especialmente quando da época da ecdise (muda da carapaça), pois além de abrigo e sossego, precisam se esquivar daqueles que aproveitam dessa vulnerabilidade para evitarem ser devorados – por causa disso, especialmente para aquários (paludários) comunitários, aconselha-se escolher cuidadosamente os peixes e animais que compartilharão o espaço.

Peixes do Pantanal

São quase 300 espécies de peixes conhecidas no Pantanal, onde inúmeras são comercializadas com fins alimentícios (ex: Pintado/Surubim – espécie ameaçada), mas outras tantas são ornamentais. A seguir veremos algumas delas, sendo que preferi começar pelas que mais gosto e as mais comuns:

Apistogramma borellii – este pequeno amigo (tamanho: 4 cm), embora territorialista, como um bom ciclídeo, é pacífico em relação aos companheiros de aquário. Peixe de fácil manutenção. Prefere substrato arenoso, plantas, rochas, raízes e troncos formando tocas. Temperatura: 24 a 28°C e pH: 6.0 a 7.0.

Mato-Grosso (Hyphessobrycon eques) – espécie ativa e de fácil manutenção, deve ser mantida em cardume, necessitando de área livre para nado e zonas com vasta vegetação; chega só até uns 4 cm, é uma voraz mordiscadora de nadadeiras. Temperatura: 22 a 26°C e pH: 5.0 a 7.8.

Coridora-Anã (Corydoras hastatus) – peixe gregário de pequeno porte (2,5 cm), muito pacífico, para o qual se recomenda substrato arenoso, com plantas e troncos como forma de refúgio para se esconderem. Temperatura: 25 a 29°C e pH: 6.0 a 8.0.

Ituí Cavalo (Apteronotus albifrons) – embora fique imenso (50 cm), é comum nas lojas de aquário. É um peixe elétrico, mas não dá choque na gente, ele usa isso para interagir com o ambiente: caçar à noite, encontrar companheiro e marcar território (para um aquário, as recomendações são para que seja mantido sozinho ao invés de pares ou grupos – a não ser que estejamos falando de um big aquário).  Ocorre em rios e riachos com fluxo constante de água e de fundo arenoso, sendo que o layout aconselhável inclui areia, troncos e muitas folhas para promover sombra, pois como são tímidos durante o dia, precisa ter um abrigo diurno. Temperatura: 23 a 28°C e pH: 6.0 e 8.0.

Mocinha-Zebra (Characidium aff. zebra) – tem um porte interessante (7,4 cm) e costuma ser pacífico, ainda que encontremos relatos de ataques a peixes mais lentos ou de nadadeiras longas. Nada se apoiando ao fundo e é conhecido também por ser de fácil manutenção. Temperatura: 18 a 28°C e pH: 5.5 a 7.4.

Borboleta-Prateada (Gasteropelecus sternicla) – como seu similar amazônico, adora saltar, então, é ultra necessária uma tampa bem colocada! Como vive próximo à superfície, para ambientá-la use plantas flutuantes, além das fixas no substrato. Recomenda-se fluxo de água moderado e que seja mantida em cardume. Seu tamanho é de 4 cm. Temperatura: 23 a 30°C e pH: 5.5 a 7.0.

Tetra Preto (Gymnocorymbus ternetzi) – muitíssimo comum, trata-se de um peixe resistente, bonito e de ótimo tamanho para o hobby (7,5 cm). Já há muita seleção e modificação genética nele, tanto que você encontra facilmente albino, rosa, véu e freak. Temperatura: 20 a 26°C e pH: 6.0 a 8.0.

Deu pra ver que peixe pantaneiro tem muitos e são muito conhecidos né? E olha que tem mais e são coisas lindíssimas! E das plantas? Bora ver!

Plantas

Como não sou especialista em plantas, para saber de onde cada uma vem, gosto de consultar fontes que me tragam alguma confiabilidade, assim, acabei me deparando com uma publicação da Embrapa de 2000 sobre plantas aquáticas do pantanal e tirei várias informações legais.

Para falar resumidamente, o que se precisa ter em mente quando você for escolher suas plantas, essa decisão deve ser tomada com base no tempo que deseja dedicar em termos de manutenção (podas, nutrição, iluminação, CO2). É comum encontrar quem prefira plantas de crescimento lento, baixa exigência luminosa ou nutricional, justamente por isso.

Aqui vão umas que selecionei, verificando, ao menos, alguma ocorrência no hobby:

Azolla caroliniana e A. filiculoides; Salvinia auriculata; Pistia stratiotes (alface d’água) – lembram que falei dos ambientes de aguapé? Então, nada a ver eu sei, mas como estas aqui são flutuantes e pequenas, talvez possamos usá-las para um “camalote diferenciado”.

Não consegui informação segura de musgos do Pantanal, pode ser porque muitos sejam cosmopolitas, mas é claro que outras pesquisas podem auxiliar nisso. Servem tanto para imersão, quanto para usar em ornamentação aérea, no caso de um paludário (também na borda – transição água/terra).

Dentre as que podem ser afixadas no substrato, olha aqui que lista massa: Echinodorus lanceolatus e E. tenelus, Sagittaria guayanensis, Marsilea crotophora, Hydrocotyle ranunculoides, Cambomba furcata, Eleocharis elegans (e várias outras) e Ludwigia elegans (e várias outras).

Com essas dicas já garanto que a beleza tomará conta, se você for ainda mais a fundo nas pesquisas, certamente o resultado será absurdo!

Well, vou ficando por aqui, agradecendo sua companhia em mais este podcast. Forte abraço, vejo vocês no próximo! Até lá!

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