Sabemos que a Amazônia é o local mais rico em biodiversidade neste planeta, o que não seria diferente quando voltássemos o olhar para a vida dentro da água. Talvez seja por isso que tantos aquaristas tentam reproduzir o ambiente encontrado em rios, lagos, igarapés e minúsculos riachos desse bioma.

Veremos neste podcast que a diversidade de características encontradas torna improvável um aquário amazônico ser chamado de monótono. É tanta coisa que seria impossível abordar cada especificidade num único podcast. Assim, como a maioria das vezes, a ideia é dar apenas um gostinho de quero mais. Vamos lá!

Quando idealizamos um aquário dessa forma, ou seja, dando a ele aspecto de um determinado bioma, estamos na verdade criando um aquário numa categoria que costumamos chamar de biótopo, que nada mais é que um aquário estudado para que se torne um ambiente o mais próximo daquilo que encontramos na natureza. Isto é, escolhemos um determinado ambiente e tentamos replicá-lo num aquário.

Visto isso, vamos organizar alguns macrotemas para que, com eles, você possa criar algum ambiente amazônico (aquático) dentro de casa. De modo geral, ao falar em qualquer biótopo, acredito que se dividirmos em 4 partes o que precisamos saber, já teremos uma boa noção do que nos espera. Nesses grandes tópicos eu separaria: água, layout, peixes e plantas. Comecemos do começo:

Tipos de água do ambiente Amazônico

Se você é assíduo por aqui, vai rapidinho se lembrar que um dos primeiros podcasts falava dos apistogrammas e dentro dele tínhamos uma parte muito importante que falava dos 3 tipos de água preponderantes, que são a água clara, a água negra (ou escura) e a água branca. De forma resumida podemos assim classificá-las:

Água negra: também conhecida por black water, é a água com aquele aspecto de chá mate. Caracteriza-se por possuir ácidos húmicos e fúlvicos e um composto chamado tanino, oriundos da decomposição vegetal (folhas e troncos no aquário propiciam alcançar esta característica); fatores que fazem o pH despencar para a acidez. Cursos d’água com esta denominação são, normalmente, pobres em nutrientes (minerais dissolvidos), com boa transparência e possuem fluxo lento. Todavia, não basta ser escuro para ser black water, mas sim ter as características mencionadas; digo isso porque muitas vezes rios escuros podem ter sido tingidos por influência dos sedimentos do leito. Nosso rio Negro é o maior black water do mundo; são também classificados assim o Tefé, Arapiuns (afluente do Tapajós), Vaupés (afluente do Negro) etc.

Já a água branca, ou do inglês white water, por sua vez, indica água rica em nutrientes, com grandes concentrações de matéria dissolvida e em suspensão, tendendo a ser túrbida; pH mais alto, próximo ao neutro. Os rios Purus, Juruá, Japurá e Madeira são exemplos. Mesmo chamando-se “branca”, ela apresenta a cor dos sedimentos/materiais predominantes que estiverem em suspensão. Rios com esta água são responsáveis por até 80% do montante de pesca para consumo humano.

Por fim, as águas claras (clear water) são águas que têm características mais próximas às negras, com exceção da cor, pois advêm de regiões de drenagem donde não têm muito o que carrear (zonas de baixa erosão).

Comecei pelo tema dos tipos de água porque sempre é o mais importante, pois é onde o peixe estará inserido. Não necessariamente você precisa começar a planejar por aqui, pode ser que prefira escolher primeiro o layout X ou o peixe Y para daí partir para a caracterização do habitat, e isso é ok também.

Os Layouts

Qual a cara de um aquário amazônico? Diferentemente do que alguns podem pensar, que tudo se resumiria ao fundo de rio de aspecto lamoso e algumas plantas de folha grossa, podemos pensar em tantos tipos de ambiente (ou praticamente, ornamentação), que preferia destacar apenas alguns dos mais visualmente impactantes.

Galhada: aos amantes dos discos é bem provável que já tenha sido ouvido o termo e não haja novidade. Uma galhada nada mais é que um entrelaçamento de galhos, troncos e raízes formando um emaranhado, por onde os peixes nadam e escondem. Para evitar a monotonia do marrom, algumas plantas podem ser adicionadas, seja de superfície, sejam as epífitas (como musgos) ou ainda, se houver áreas onde a luz incida até o fundo, plantadas no substrato (como Nimphea). Isso aqui me faz lembrar os igapós (do tupi, rio de raízes), que são áreas preparadas para a inundação, cujas plantas (seus troncos e raízes) estão adaptadas ao processo, ficando submersas sem perecer.

“Plantado”: coloco entre aspas pelo fato de não estarmos falando num plantado tecnicamente correto, ou seja, com raros exemplares de peixe para não desconsertar os parâmetros. A ideia aqui seria um aquário com plantas e peixes amazônicos, ainda assim, por haver muitas plantas, é importante observar as exigências dos vegetais também devem ser postas no planejamento, que provavelmente pedirão por substrato fértil, CO2 e, consequentemente, baixo fluxo de água.

Riacho (igarapé): os famosos igarapés têm pouca profundidade e avançam mata adentro e, por isso, mesclei com a ideia de riacho, pois fala-se aqui de um curso de água corrente, como a ideia seria reproduzir características do ambiente escolhido, o riacho tem água corrente, o que implicaria na inserção de alguma bomba submersa para dar esse efeito. Para facilitar, talvez fosse interessante plantas menos exigentes, pois com o fluxo de água, naturalmente seria mais difícil manter o CO2 na água. Áreas de mais luz e áreas de sombreamento; se houver possibilidade de ter plantas emergentes, que sombreiem a água, ainda daria mais um toque de realidade, simulando a mata ao longo da margem.

Plantas aquáticas de origem amazônica

Embora uma grande parte das plantas mais queridas no aquarismo sejam da África e da Ásia, temos uma porção de belas espécies no bioma amazônico. Todavia, por assumir não conhecer a fundo plantas e suas origens, vou me deter citar gêneros que ocorrem na Amazônia para orientar sua pesquisa em quais espécies escolher para colocar no seu aqua temático.

Começo pelo gênero Echinodorus, que possui dezenas de espécies usadas no hobby, das mais cobiçadas às mais comuns, e é donde vem uma das mais famosas, que encontramos para comprar sob o nome “amazonense” (E. bleheri). Ela é pouco exigente, mas cresce muito, até uns 50 cm de altura.

Da mais belas e famosas, posso citar o gênero Nymphaea, que são aquelas belas plantas com folhas flutuantes e caule submerso, fixos no substrato (suas floradas são lindas, porque são lançadas para fora da linha d’água). Muitas são asiáticas, mas encontrei citação sobre a Nymphaea amazonum no livro do querido amigo Rony Suzuki (Guia de Plantas Aquáticas) e fiquei mais confiante em citar aqui como pertencente ao bioma que exploramos.

Para ocupar a superfície, como flutuante livre, há a alface d’água (Pistia stratiotes), que devem estar em aquário com pouco fluxo de água. Dos muitos musgos existentes no aquarismo, considerando a mesma fonte citada antes, só vou citar o gênero Vesicularia, como referência da América do Sul, para não sair muito da zona de segurança.

E por fim, como outros gêneros que devem ser considerados em sua escolha, cito: Eleocharis, Hydrocotyle, Ludwigia e Sagittaria.

Peixes amazônicos: cores, formas e comportamentos únicos

Antes de entrar nas espécies, propriamente ditas, lembro que falamos dos biótopos amazônicos, então, independente das demais características da água, a temperatura não deve ser inferior aos 25 ºC, assim, é essencial um ótimo termostato mais aquecedor! As espécies que cito a seguir são compatíveis entre si em sua maioria e podem ser arranjadas num aquário conforme algumas especificidades. Vamos ver quem são:

Neon (Paracheirodon axelrodi): um dos mais desejados peixes do hobby dos aquários é amazônico! É um peixe de cardume. Tamanho de 2,5 cm. Manter o pH entre 4.0 e 6.0.

Borboleta (Carnegiella strigata): também conhecida como machadinha-mármore. São peixes de cardume, nadam junto até a superfície; encontrado em igarapés (de águas negras) e seria interessante ter plantas flutuantes ou cujas folhas cheguem à superfície para proporcionar abrigo. Tamanho de 4 cm. Manter o pH entre 5.0 e 8.0.

Lápis (Nannostomus eques): esta é uma das várias espécies de peixes-lápis. Seu nado é oblíquo e requer águas de fluxo lento e vegetação densa (águas negras); prefere os estratos mais superiores da água. Nada em cardumes. Tamanho de 3,5 cm. Manter o pH entre 5.0 e 6.0.

Rodóstomo (Hemigrammus rhodostomus): são bastante pacíficos, devem ser mantidos em cardumes, em aquário comprido, pois são ativos e gostam de se deslocar bastante. Ficam na meia água, mais próxima ao fundo. Iluminação moderada desejável. Água negra. Tamanho de 5 cm. Manter o pH entre pH: 5.5 e 7.0.

Corydoras julii: uma das mais simpáticas e conhecidas corys, também encontrada sob o nome “leopardo”, por causa das inúmeras pintas. É um peixe de fundo e adora ser mantido em cardumes. Tamanho de 5cm. Manter o pH entre 6.0 e 8.0.

Corydoras sterbai: ótimo peixe e opção para aquário de água negra, pois você pode ornar com folhas mortas, troncos e raízes, deixando aquele aspecto de “chá”; isto não significa deixar a água deteriorar, as folhas devem ser trocadas periodicamente. Peixe gregário. Tamanho de 6,8 cm. Manter o pH entre 6.0 e 7.5.

Cascudo-Tigre (Peckoltia vittata): é bom lembrar que existe mais de uma espécie de cascudo sob o nome “tigre”. Ele tem hábitos “vegetarianos”, podendo atacar algumas plantas de folhas mais tenras (muitos hobbystas oferecem pepino para ver se ele esquece das plantas, porém, nem sempre funciona). A espécie, que tem hábitos noturnos, costuma ser sociável, exceto com peixes da mesma espécie (neste caso costuma se aconselhar a ter um aqua maior, onde cada cascudo possa ter sua caverna). Tamanho de 15 cm. Manter o pH entre 5.0 e 7.5.

Panaque (Panaque nigrolineatus): este cascudo é maravilhoso, mas tem um probleminha: fica imenso, com mais de 40 cm. O comportamento e as preferências alimentares são parecidas com a do Tigre, citado anteriormente, porém, há citações de que sejam capazes de digerir madeira, o que justifica seu reconhecido hábito de “roer” troncos submersos. Gosta de água bem movimentada (oxigenada). Manter o pH entre 6.5 e 7.5.

Disco (Symphysodon spp.): o acará-disco, ou simplesmente disco, engloba (oficialmente) três espécies: S. discus, S. aequifasciatus e S. tarzoo. São tímidos e mais sensíveis, o que não o qualifica para iniciantes ou aquas com muitos peixes agitados. Se for colocar, optar por pequenos grupos. Peixe de meia água. Tamanho de 15 cm (médio entre as espécies). Manter o pH entre 4.2 e 6.2.

Acará-bandeira (Pterophyllum scalare): este peixe é imensamente popular no hobby. Habita regiões alagadas, densamente vegetadas, com águas claras ou turvas. Peixe de meia água. Aconselhável mantê-lo em pequenos grupos de 4 a 6 indivíduos. Tamanho de 15 cm. Manter o pH entre 6.0 e 8.0.

Apistogramma cacatuoides: indubitavelmente o mais famoso dos apistos. Sua denominação “cacatuoides” advém das “mechas” (raios dorsais) que saltam eriçados de sua nadadeira superior, dando o aspecto de uma cacatua (pássaro). Peixe de meia água, mais próximo ao fundo. Tamanho de 8 cm. Manter o pH entre 6.0 e 8.0

Apistogramma agassizii: um dos meu preferidos, os machos têm a cauda em lança, sempre colorida e são maiores (7,5 cm) que as fêmeas. Podem ser achados nas águas negras ou claras. Manter o pH entre 5.0 e 7.0.

Deu para reparar que dentre os peixes citados, têm aqueles que habitam diferentes estratos da água (superfície, meio e fundo)? Então, aquaristas mais experientes sabem que isso permite com que mais peixes habitem o aquário, claro, desde que o layout (plantas, cavernas etc.) ajude a dividir esses níveis e o aquário receba equipamentos (especialmente filtros) para manter a qualidade da água (mais peixes, igual a mais sujeira).

E, com isso, chego ao final de mais um podcast. Espero que tenha gostado e que alguma coisa aqui dita sirva de informação, inspiração ou instigação para checar as informações dadas. Espero vocês no próximo. Até lá!

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