Acho que cabe começar diferenciando aquários plantados dos aquários “com plantas”. A princípio, para os mais desavisados, soa a mesma coisa, mas, em termos técnicos, não é. Ter um aquário com plantas é simplesmente: você vai à loja, compra molhos daquelas plantas com os quais seus olhos se simpatizaram, firma no cascalho do aquário de qualquer jeito e deixa lá até que comecem a morrer, pois “plantas duram pouco mesmo”. Sem falar que tem uns aquários “plantados” que parecem aqueles teatros antigos, que, quando o espetáculo acaba, as cortinas (de plantas) se fecham, mas, nesse caso, estão sempre fechadas, pois a pessoa não teve o cuidado de fixar as plantas de crescimento rápido mais atrás (talvez nem saiba que era pra ter esse cuidado), deixando que tomassem conta. Nesse aqua o cara tem a sorte de encontrar seus peixes, pois mal dá pra ver. Tudo bem, nem todos são assim, alguns ainda tentam prover à visão aquele status clean, situando as plantas em lugares apropriados. Todavia, dependendo das espécies de plantas e suas exigências, o futuro desses vegetais é incerto. Do outro lado dessa comparação, se pegarmos no sentido mais estrito do significado de “aquário plantado”, poucos são os tipos de aquário que possuem mais restrições para colocar peixes dentro. Os holofotes estão quase 100% voltados para as plantas. Não só em termos de espécie a ser escolhida, mas também sua quantidade importa. Muitos aquaristas desta classe, inclusive, têm zero indivíduos em seus plantados. Vamos entender o porquê.

O que fazer para mandar bem num aquário plantado? O que nele é tão diferente do aquário com plantas? Um aquário plantado, além do óbvio bem-estar das plantas, busca a harmonia (no sentido completo) e esta palavra é um dos maestros da sinfonia (o outro é você), como veremos a seguir. 

 Começando a entender de plantados – informações básicas

Como já era de se esperar, o objeto principal desse aquário são as plantas. São elas que terão a verdadeira atenção do aquarista, sendo que ele planejará tudo para que elas cresçam bem e, só então, pensará com o que povoar em termos de fauna ou mesmo se haverá animais. Esses cuidados se tornaram tão aprimorados que hoje em dia temos um termo muito difundido entre os aquaristas desta especialidade: aquapaisagismo, que nada mais é do que transformar aquele aquário numa “pintura”, numa obra de arte. Podemos tratá-lo como um upgrade do aquarismo, pois tem inovado o modo de se ter aquários. Não aprofundarei no tema porque já tivemos um Sarlocast falando justamente sobre o layout dos aquários, onde as dicas e fórmulas foram abordadas para criar ambientes agradáveis aos olhos. Confere lá!

Ressaltam-se daí duas principais modalidades: o Aquário Holandês (cujo estilo é o de muitas espécies, colocadas em moitas por todo aquário, lado a lado, procurando não se misturar, mas tampando todos os espacinhos; e o estilo Natural (que retrata paisagens que vemos na natureza, como montanhas arborizadas, rochas tomadas por plantas e por aí vai). Independente do estilo adotado, muito conhecimento e trabalho está por vir, não sendo esta escolha recomendada para pessoas que acabaram de chegar no aquarismo (a não ser que ela tenha como contratar serviço especializado para cuidar da harmonia, enquanto ela aprende).

No meio dos hobbistas de aquário plantado, quando você diz “planta” fica todo mundo te olhando, porque é quase uma palavra abstrata. Se você quer fazer bonito, você precisa usar os nomes específicos, como Ludwigia arcuata, Glossostigma elatinoides ou Echinodorus tenellus. Sim, porque cada planta pode requerer diferentes qualidades de luz, nutriente para raiz ou para folha, cresce mais rápido ou mais lento etc., o que pode influir na decisão de tê-la ou não, colocá-la na frente ou no fundo do aqua. E é por causa dessas “excentricidades” que falaremos a partir daqui do que mais importa e não pode ser esquecido quando o assunto é aquário plantado.

Nutrientes

Para a esmagadora maioria das espécies de plantas, a nutrição (assim como a montagem do próprio aquário) começa no substrato. É muito comum esse substrato ter duas camadas: 1) a fértil, normalmente feita de substrato pronto, industrializado, específico para a questão; e 2) a inerte, que vem por cima da primeira com funções de decoração, fixadora e isoladora (para que os nutrientes da camada inferior não invadam a coluna d’água como bárbaros hunos). Nesta última, procure por uma granulação adequada para não compactar (fina demais) ou que não prejudique o enraizamento e o isolamento (grossa demais). O substrato normalmente é assentado no aquário com inclinação de 5 cm na frente a 10 cm atrás – se a granulometria for uniforme, facilita o acúmulo de sujeira na frente, auxiliando na limpeza. A camada fértil normalmente tem 1 cm de espessura.

Como todo bom jardineiro, sabemos que um dos segredos do jardim é a nutrição, assim somos capazes de prever que um dia o “fértil” desse substrato se extinguirá, sendo que, nesse caso, precisaremos da fertilização líquida, diluída diretamente na água, para aquelas plantas que absorvem por meio das folhas (ex: Cabombas e Elodeas absorvem os nutrientes diretamente da água) e em forma de pastilhas e cápsulas, colocadas junto às raízes, para aquelas que se nutrem pela raiz. Para tanto, é importante atentar para a qualidade da fertilização, pois aqui falamos tanto de macronutrientes (nitrogênio, fósforo e potássio, sendo estes os principais, mas também há que se considerar o cálcio, o enxofre e o magnésio, num segundo plano) e de micronutrientes (ferro, cobre, manganês, molibdênio e boro, dentre os principais). Não é incomum percebermos o crescimento de folhas fracas ou sua queda, mesmo quando vemos todo o resto de nossa montagem está correta; é nessa hora que precisamos atentar para a fertilização, pois pode ser que estejamos falhando nisso. 

Só o arroz e o feijão não são capazes de atingir o máximo do desenvolvimento de um ser vivo (dá para pensarmos no aqua como um ser vivo, para efeitos dessa comparação), assim precisamos também considerar fatores importantes para o processo de fotossíntese, pelo qual as plantas se desenvolvem.

Mais parâmetros importantes

Certo de que você se lembra das aulas de ciências, onde aprendeu que as plantas precisam da luz, da água e do gás carbônico para produzir glicose e liberar oxigênio, certo? Assim, quando nos referimos à iluminação, não estamos falando sobre acender uma lâmpada qualquer e deixar lá, tampouco o assunto se resume ao que falaremos aqui. Precisamos ter em mente que esse é um fator vital para o aquário plantado, pois ele está diretamente ligado à fotossíntese. Comprar a lâmpada certa, na quantidade correta, fazendo-as funcionar pelo tempo adequado é a fórmula para o sucesso (ou parte dele). Devemos atentar para a capacidade luminosa, medida numa unidade chamada Kelvin (K), sendo que a faixa ideal (que também denominamos temperatura da cor) está entre 5.000 e 8.000 K, uma faixa espectral adequada para a fotossíntese. Sua estrutura deverá operar por 8 ou 12h por dia (10h é um número muito apropriado como média), dependendo das plantas escolhidas. Evite a proximidade com as janelas, que por ter luminosidade forte, somada com a que você utiliza, pode gerar blooms de algas, e ninguém quer isso, não é mesmo!?

Faltou falar do gás carbônico, o CO2, não porque não importa, mas pra deixar bem frisado o quão importante é esse gás para a saúde das plantas. Ele é imprescindível para a fotossíntese. Assim, para entrar no caminho dos aquários maravilhosos, você precisa de um sistema de injeção de CO2, seja ele caseiro, à base de fermentação de açúcar numa garrafa PET, por exemplo, cuja medida aproximada será de uma bolhinha por segundo, ou um aparato próprio para tal, com cilindro, regulador de pressão, difusor etc. que diminui a mão de obra do aquarista e confere mais segurança como um todo. Eu não falei da medida caseira à toa não, nós precisamos saber se está entrando CO2 no aquário e se ele está sendo aproveitado pelas plantas. Dá para se ter uma ideia dos níveis de CO2 medindo-se o pH, que deve estar de ligeiramente ácido (6,8) a ligeiramente básico (7,2); se estiver muito abaixo de 6,8 a quantidade de CO2 pode estar alta, pois isso significa a formação de ácido carbônico; o contrário indicaria pouca quantidade. Caso o pH não se segure, talvez seja hora de intervir com algum condicionador de KH. O tempero certo vem da experiência e precisão do aquarista. 

Visto isso, podemos entender que há um tripé sustentando um aquário plantado de sucesso: iluminação adequada, substrato fértil e injeção de CO2.  

Aquilo que você pensava que não importava para as plantas

Filtragem e temperatura. Confessa vai, você não sabia, mas é verdade. É posto que o ideal de temperatura para um aquário plantado deve girar de 24 a 28 oC, pois as plantas mais usadas se desenvolvem melhor nesse intervalo. Quanto à filtragem, e circulação de água, convém manter algo entre 3 a 5 vezes o volume do aqua por hora, pois a excessiva circulação expulsa o CO2 em velocidades que não queremos. O tipo de filtro (traseiro, canister ou interno) fica a seu critério, lembrando que, se houver mídias filtrantes para filtragem química, é bom saber direito se o tipo usado não retirará elementos que você adicionou à água, como por exemplo os fertilizantes. Outra coisa importante é o filtro UV, que deveria ser sempre usado, já que sua função aqui seria a de se evitar a água verde (lembra do tanto de nutrientes que a gente põe? Então, não são apenas as plantas que compramos que usarão). E por falar nas algas malquistas no visual, saiba que a alta circulação de água ( = excesso de oxigênio) também pode estimular o surgimento de algas filamentosas e aqueles tufinhos que conhecemos como petecas, que gostam de crescer nas zonas mais movimentadas.

Arrumando a casa 

O layout é o ponto crucial para você ter a sua frente um aquário que lhe dê prazer quando você chega do trabalho cansado, querendo espairecer um pouco. Tudo começa com a seleção dos troncos e rochas (o hardscape), os quais comporão, juntamente com as plantas escolhidas, sua orquestra. Seria interessante optar por itens que interajam pouco com a água, quimicamente falando, o que torna apropriado comprar com orientação de loja especializada. Busque por aqueles exemplares com reentrâncias, nós, cores, curvas, e feições singulares, que promovam interesse, curiosidade ou algo assim, e sejam intrigantes e misteriosos. Escolha um principal. 

Dica para não ter surpresa com as cores das rochas: molhe-as antes. Essa é uma manha de quem prima por layouts agradáveis, que normalmente utilizam pedras mais escuras, com tonalidades parecidas. Isso porque, quando secas, muitas vezes as rochas podem ser parecidas, mas quando molhadas podem até mesmo ter cores bem distintas, o que pode destoar de todo o cenário idealizado, prejudicando-o.

Para arrumar a casa, não ponha tudo no aquário sem critério, faça esboços no papel do arranjo desejado e, quando puser no aquário, afaste-se para olhar e tenha um vislumbre de como ficará. Uma dica: para o seu objeto principal, seja ele um tronco ou uma rocha, calcule o centro do aquário e assente-o deslocado dessa posição central, alguns centímetros para esquerda ou para a direita. Essa dica baseia-se na proporção áurea, uma fórmula matemática cujo princípio é que você tenha apenas um chamariz, um ponto focal, responsável por atrair a visão do observador ou lhe dar senso de direção (é um natural “pra onde olho?” ou “por onde começo apreciar?”). Não quero dar aqui as fórmulas, não porque sejam segredos, mas sim porque há mais dicas no nosso podcast sobre layout. Existem livros e sites que tratam isso muito bem e, quando você for buscar essa informação, verá o porquê de não querer reduzir tanta coisa importante em poucas palavras. Vale a pena ler e aprender essa arte!

Povoamento

Se você chegou até aqui é porque tem a intenção de fazer algo melhor na próxima vez que for montar seu plantado (ou transformar o seu “com plantas” num plantado). Assim, saiba de antemão que, tal como peixes inapropriados, existem plantas vendidas em lojas de aquário que não rolam, porque são plantas que não têm todo seu desenvolvimento sob a água. Por isso não é verdade que “plantas de aquário duram pouco”, pode ser que você tenha comprado apenas desses tipos não apropriados.

Para ter plantas aquáticas verdadeiras, escolha espécies dos gêneros: Ludwigia, Glossostigma, Riccia, Rotala, Sagittaria, Cryptocoryne, Microsorum, Vallisneria e Echinodorus. Esta lista não é, nem está perto de ser, exaustiva, pois há muito (muito) mais no universo de espécies para se escolher. Lembramos apenas que é necessário conhecê-las antes de adquiri-las, pois elas têm tamanhos, manhas e especificidades peculiares.

Dentro do blá-blá-blá da perfeição, que fala de peixes que vão “corromper” o equilíbrio das condições da água, devem surgir pensamentos do tipo: “é tão difícil ver um aqua sem peixes”, não é mesmo? De forma rebelde dá até pra gente pensar em peixes que cabem nesses aquários. Que tal um cacatuoides (Apistogramma cacatuoides)? Este não cresce muito e tem belas nadadeiras que darão mais cores ao seu layout. Neons (Paracheirodon axelrodi) estão entre os mais comumente usados. Os limpa-vidros (Otocinclus spp.) podem se tornar aliados no combate ao excesso de algas, uma vez que se amarram em ficar raspando a superfície de rochas, troncos e folhas (e vidros, claro!). Alguns aquaristas usam invertebrados (caramujos e camarões) para ajudar a ‘limpar’ o aquário, consumindo restos de comida e auxiliando na degradação de matéria orgânica. Camarões-fantasma dos gêneros Palaemonetes e Potimirim e caramujos Neritina e Pomacea estão entre os mais comuns; Melanoides tuberculata também é mencionado dentro os utilizados.

Não quero recomendar ou banir nada disso, pois isso vai da experiência e do gosto do aquarista. O importante é observar o intuito do seu aquário: você é o maestro. Pense: peixes precisam ser alimentados, alimentos trazem nutrientes para o aquário, excessos de nutrientes causam desequilíbrio no aquário plantado. O que fazer? Talvez tudo que seja necessário consista em controlar os parâmetros, o que possivelmente pode ser resolvido com testes e trocas parciais para manter os padrões. Esse caminho é perfeitamente viável, mas não exagere, consuma com moderação! Quanto aos caramujos, o assunto também merece reflexão, pois quando se tem uma camada inerte que serve para isolar o substrato fértil da água é preciso pensar que algumas espécies (como melanoides) vivem dentro da areia, remexendo tudo; avalie, talvez não compense; outros gostam de botar ovos pelo aquário (ou fora dele); pergunte também ao lojista se a espécie visada não come plantas aquáticas. Por esses detalhes, talvez, não sejam ideais para todos os aquários.

Essa foi apenas uma introdução ao mundo do aquário plantado, um tipo de aquário em que você não pode agir por impulso comprando peixes e plantas para preenchê-lo. Todavia, não há como negar que os resultados são cativantes, atratores de elogios e responsáveis pela paz interior que sua alma merece. Mais uma vez, obrigado pela audiência! Vamos em frente conhecendo o mundo do aquarismo!

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