Poucas pessoas mantêm aquários com um só tipo de peixe, portanto, as misturas são corriqueiras. Tendo em vista os aquas comunitários serem os mais comuns, o que se pode esperar quanto ao que existe de mistura de peixes? Acho que o melhor é começar tentando definir o que seria um aquário comunitário, para eu tentar mostrar as outras opções que quero comparar. Para a maioria dos hobbistas parece óbvio, mas vai que tem alguém aqui que está começando do zero, não é mesmo? Ou nunca pensou numa definição para aquário comunitário…ou qualquer outro tipo de aquário. Vamos lá…

Aquários Comunitários

Se alguém me pergunta o que é um aquário comunitário eu respondo: “é um tipo de aquário onde se juntam espécies diferentes, sem considerar origem, aspectos ecológicos ou físico-químicos” – em termos modernos e simples seria um “mix de peixes sem muitos critérios”. Por que defino assim? Pois bem, pense comigo…Muitas vezes, para fugir da monotonia do dia a dia, uma pessoa resolve montar um aquário. Olha para as cores dos peixes na loja e apenas deduz que o número diverso de cores será geometricamente proporcional à alegria que irão proporcionar em sua casa. É uma ideia mais romantizada que realista, pois nós, que já lidamos a algum tempo com peixes, sabemos que cada espécie é um universo de características e que tal mistura pode não “dar bom”. Um aquário povoado assim, por escolhas alheias às características dos peixes, e tão apenas por cores ou formas, seria talvez o mais comum dos aquários comunitários que existe.

Por outro lado, seria heresia de minha parte dizer que não existem aquários comunitários exitosos. Quando a pessoa já começa definindo critérios para aquisição de peixes, já reflete algum compromisso e isso é positivo. Digamos que o dono do aquário queira começar, dentro dos peixes coloridos que ele quer, fazendo questionamentos do tipo: “dentre esses peixes aí, quais são pacíficos? Ou, quais deles comem o mesmo tipo de comida? Ou ainda, quais deles têm o mesmo pH como ideal?”

Para você, isto aqui soa como vantagem ou desvantagem? Eu respondo: vantagem! Se você não consegue visualizar desvantagens, tentarei ilustrar a seguir alguns exemplos triviais de problemas de misturas de peixes. Já adianto que não tem a ver com poder aquisitivo, pois peixes mais caros não são peixes melhores…o preço de peixes está relacionado a diversos fatores, mas não com o fato de ser um peixe bom ou ruim para ser misturado com outros. Bem, vamos ver sob a forma de exemplos:

Um exemplo de baixo custo, mas com grandes chances de fazer dar tudo errado seria misturar “um” Mato-Grosso com um Beta ou um Kinguio, em aquários pequenos. Ao contrário do que muitos pensam, Betas são peixes super “de boa” (brigam só com peixes da mesma espécie), por outro lado, e o motivo de ter citado, peixes de nadadeiras grandes tornam-se mais suscetíveis a doenças promovidas por fungos e bactérias. Onde entra o Mato-Grosso? Seu nome científico significa “pequeno mordedor” e as mordiscadelas que venha a dar em irresistíveis super caudas, são a oportunidade ideal para o acesso de patógenos nas áreas feridas.

Deixei o “um” acima entre aspas de propósito para chamar a atenção para outra coisa: Mato-grosso é um peixe de cardume, sendo que o fato de colocar apenas um exemplar no aquário deixa-o deslocado de seu contexto natural, o que pode vir a refletir em estresse, aumento de agressividade, entre outros.

Outro exemplo de misturas comuns que causam prejuízos: discos juntos com peixes muito agitados. O que acontece? Discos são normalmente muito tímidos e quando existem companheiros muito competitivos e agitados essa timidez literalmente o adoece. Começa com estresse, onde o peixe mais se esconde que nada, muitas vezes acompanhado de um enegrecimento do indivíduo (perda de cor), levando-o à má alimentação e, consequente, deixando-o inclinado a pegar muitas doenças, devido a debilidade nutricional.

Mais uma coisa que ocorre com frequência é ter espécies que crescem demasiadamente em relação ao demais peixes do aquário. Um exemplo é o “Zebrinha” (nome que por estar no diminutivo pode levar pessoas a cometer erros, cuja lição é um tanto quanto dura). Além de se tornarem peixes agressivos e destruírem a decoração do aquário, por ficarem enormes e terem uma dieta voltada para a carnívora, podem devorar peixes diminutos como neons, tetras, paulistinhas etc.

Esse assunto de dieta é importantíssimo de se observar, não necessariamente para casos tão trágicos como o do Zebrinha, mas num tom geral mesmo. Imagina comprar peixes herbívoros e piscívoros (que comem peixes) para colocar no mesmo aquário; a não ser que você tenha uma ótima estratégia para alimentá-los, não é uma boa misturar só porque são bonitos. O mesmo valeria para a mistura de peixes de água alcalina e de água ácida, porque alguém vai sair perdendo, assim é melhor preferir peixes de um só tipo de água, ou manter um pH próximo ao neutro, pois grande parte dos peixes de aquário fica bem nessa faixa de pH.

“Nossa, parece muito difícil! O que eu faço para não me frustrar assim no aquarismo?”. De certo temos hoje em dia lojistas muito bem-preparados, porém, vai que já é fim de expediente, o cara tá cansado demais e ele esquece de observar algo importante pra te aconselhar numa compra de peixes. Seria ruim né (para você especialmente)? Por isso vale a pena estar minimamente preparado para não ter que contar apenas com o preparo de terceiros. Já saia de casa com uma ideia dos peixes que estarão aptos a viver no seu aquário. Cultive a paciência para dar tempo de planejar, pesquisar e implementar com a segurança de quem tem alguma informação a seu favor.

Ainda assim, já antecipo algumas dicas práticas: 1) Se o aquário é pequeno, então, dê preferência a peixes pacíficos, de tamanho pequeno quando adultos. 2) Procure saber se o peixe é de cardume, para comprar pelo menos 4, caso ele seja. 3) Tenha preferência por pH neutro ou escolha peixes com faixa de pH similar. 4) Prefira peixes onívoros (que comem vários tipos de alimento). 5) Evite aglomerações volumosas (povoe o aquário com parcimônia!).

“Isso são regras obrigatórias?” Não, mas ajudam muito na nossa trilha aquarística. Tanto que a observação e o planejamento dos hobbistas os levaram a criar aquários que consideram com muito critério as misturas, buscando chegar num nível onde vantagens superem, em muito, as desvantagens. Os nomes são muitos: aquários-biótopo, aquários de espécies determinadas, mono-específicos etc. Bora ver o que seriam tais tipos de aquário.

Aquários Planejados

Neste tópico não trataremos de projetos de desenvolvimento de aquários, mas tão somente avaliar por alto como o fato de planejar um aqua beneficia um aquarista.
Um aquários-biótopo, por exemplo, é um tipo bem técnico que recria um certo ambiente, tal como existe na natureza. Dentro de um aquário desses, só será colocado o que replica o ambiente de origem. Nesse nicho são comuns os aquários amazônicos, lago Malawi, lago Tanganyika etc. Qual a vantagem disso? Plantas, rochas, troncos e peixes já coexistem na natureza, ou seja, já uma certa familiaridade entre o que existe no aquário, assim, a chances de surpresas de algum tipo são menores. O aquarista teria menos preocupações no sentido de encontrar um pH ou temperatura que se adequasse a todas as espécies ali dentro, o layout já favoreceria os habitantes, a questão alimentar também já poderia estar resolvida de antemão.

Outro tipo de planejamento diferente seria, por exemplo, “aquários de espécies determinadas”. “O que é isso?” Fácil de responder: algumas espécies têm tantas exigências (as mais variadas possíveis) que não podem habitar qualquer aquário. Exemplos? Pense em peixes muito grandes e agressivos. Um dos mais famosos é o aquário de ciclídeos Jumbo…nesse caso o aquarista pensa num grande volume, muitas vezes mal tem um layout, escolhe um pH que acolha as espécies-alvo e junta os peixes. Costumam ser peixes truculentos, ou que sabem lidar com espécies violentas, a alimentação às vezes precisa ser rica em proteínas ou mesmo peixes vivos. Ou seja, é idealizado de uma forma pouco peculiar ao aquarismo mais difundido, com muitas regras específicas etc.

Cabe ainda citar exemplos que requerem que certas misturas aconteçam para que possamos presenciar as potenciais maravilhas que as interações entre espécies proporcionam. No aquário marinho temos o peixe limpador, que procura outros peixes que gentilmente oferecem partes do corpo para que sejam “pinçadas” pela cirúrgica boca do limpador. Tais especializações são particularidades interessantes de se observar e não estão apenas nos aquas salgados. Como exemplo, cito o lago Tanganyika, onde a ocupação de nichos específicos é bem marcada e podemos refletir isso num aquário. Para tal selecionamos peixe que habitam diferentes estratos da água, como leptosomas para a superfície, julies para as rochas, shell-dwellers para conchas abandonadas de caramujos e daffodils para o meio da água. Aqui, uma correta mistura de espécies permite, inclusive, aumentar o número de peixes no aquário – claro, investindo mais em filtros e circulação de água – pois, por não ocuparem o mesmo estrato (o que diminui a competição em muitos níveis), deixam o aquarista com mais opções de preenchimento populacional.

E por que não falar de peixes que não podem ser misturados com ninguém por serem sensíveis demais? Pois é, temos essa questão também: a de peixes que definitivamente não são recomendados para serem misturados. Sim, posso citar peixes de raça como guppies e kinguios, cujas misturas com outros peixes podem ser mais prejudiciais que benéficas. Esses seriam aquários “mono-específicos”, ou seja, que estão voltados tão somente a uma só espécie, portanto, não sendo tolerantes a misturas de peixes.

Aí quando se tem uma mistura de peixes e nada foi previamente definido como nesses aí, talvez seja mais aplicável a definição mais abrangente e fiel do termo “aquário comunitário”. Ele também não é sinônimo de bagunça ou desleixo, ele também é (deve ser) planejado, sendo que se você seguir ao menos aquelas dicas que eu adiantei, já tem boas chances de diminuir problemas de convivência.

Por mim, ficaria escrevendo sem parar…mas aí não iria sobrar mais assunto pra outro podcast…agradeço demais sua presença, conto com você no próximo! Até lá!

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